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A MARIA FUMAÇA DA SERRA GAÚCHA E SUAS REVOLUÇÕES

22/10/2020 Larissa da Costa Turismo e Culinária

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Maria Fumaça. (Foto: Reprodução / Blog Portal do Inverno).

 

A saga dos italianos sobre os trilhos da Serra Gaúcha

A ideia de que é preciso “Conhecer o passado para compreender o presente e idealizar o futuro”, que o historiador grego Heródoto sustentava, no século 5 a.C, aplica-se muito bem a um passeio pela Serra Gaúcha chamado Trem do Vinho. Ele faz um percurso de 23 quilômetros, durante cerca de uma hora e meia, passa por Bento Gonçalves, Garibaldi e Carlos Barbosa, cidades colonizadas por imigrantes italianos, cujos costumes e tradições estão retratados neste itinerário.

A estrada de ferro e o transporte ferroviário foram, na época de sua construção, uma revolução de modernidade, e, ao serem retomadas no começo dos anos 1990, representaram uma volta ao passado, com a retomada e a restauração da cultura desses mesmos imigrantes dos fins do século 18 e o início do século 19.

Nas primeiras décadas do século passado, o trem acelerou o desenvolvimento no Rio Grande do Sul. Na Serra, além de encurtar distâncias, serviu para o escoamento da produção agrícola, comercial e industrial, modificando, para sempre, a paisagem da região, uma vez que, nos arredores das estações, surgiam casas de comércio, bares e pousadas. A Maria Fumaça proporcionou, assim, sua primeira revolução, no rumo do desenvolvimento e da modernidade.

Foi assim que, nos povoados serranos, a estação virou ponto de referência e, uma vez implantada a malha ferroviária, o trem fez naturalmente emergir o interesse pelo turismo. Na ocasião da comemoração de 100 anos da Estação Ferroviária de Bento Gonçalves, a historiadora Assunta de Paris comentou, no jornal O Pioneiro, que “Muita gente da capital vinha para ver as plantações de trigo, milho, hortifruti e parreiras”, assim como “para comprar artesanato, leite, queijo, manteiga e salame”, pois “O pessoal da capital considerava a nossa região colonial, uma colmeia de gente que se unia para o trabalho. Trouxeram para a nossa região a valorização do nosso agricultor”. 

A projeção econômica foi tão notável que, em 1925, seis anos depois do advento da estação, a Associação de Italianos de Bento Gonçalves estava presente numa exposição em Turim, Itália, com a publicação Cinquantenario della Colonizzazione Italiana nel Rio Grande del Sud, 1875-1925 (Cinquentenário da Colonização Italiana no Rio Grande do Sul, 1875-1925), onde a cidade teve destaque pelos produtos trabalhados, como o vinho, da região da colônia italiana.

Entretanto, a modernização seguiu outros rumos e, nos anos 1950, a implantação da malha rodoviária no Brasil fez com que as estradas de ferro fossem postas de lado. Em 1976, o transporte ferroviário da Serra Gaúcha fechou para passageiros, servindo apenas ao deslocamento de cargas. Isso, até 1992, quando a linha passa a operar para eventos turísticos, sob a concessão de Giordani Turismo, correspondendo à segunda revolução, com a retomada das tradições culturais do passado, em contrapartida à homogeneização das culturas preconizadas pela globalização.

Estação ferroviária. (Foto: Reprodução Correio Braziliense / Ana Carolina Fonseca).

 

Com o intuito de promover a restauração e a manutenção dos monumentos históricos, a empresa de turismo Giordani Turismo obteve a concessão para operar a Maria Fumaça. Para isso, planejou um roteiro turístico de trem saindo de Bento Gonçalves, onde a saga dos italianos na Serra Gaúcha é revivida num espetáculo encenado no Parque Cultural Epopeia Italiana. A descendente de italianos Margareth Golin diz que, além de lindo, todos deveriam fazer o passeio porque “Essas imagens e sensações dão uma saudade de uma vida que não se viveu, mas que está em cada descendente de italianos”.

A experiência de proteção e recuperação cultural permitiu ao local a sua segunda revolução, só que, agora, pela mediação do turismo. Em 1992, na Serra Gaúcha, havia 700 leitos disponíveis para o turismo, hoje em dia, são 3 mil. A região de vinícolas, queijos e produtos coloniais conta com inúmeros restaurantes, graças ao turismo sustentável que soube preservar o passado e promover o futuro.

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Larissa da Costa

Nascida em Porto Alegre e criada em Vacaria, na Serra Gaúcha, herdou dos seus pais a vontade de viajar. Advogada de formação, escritora de coração, aventureira por emoção, veio para a Europa em 2001 em busca de novos desafios e de seu lugar no mundo. Mãe de duas crianças, já trabalhou em diferentes áreas.